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VEIO DO INFERNO (1957) - REVISITANDO FILMES "B"



FICHA TÉCNICA

From Hell It Came (1957, EUA)
Direção: Dan Milner
Elenco: Tod Andrews, Tina Carver
, Linda Watkins,
John McNamara, Gregg Palmer, Robert Swan,

Chester Hayes e Suzanne Ridgeway.

LEIA-ME E ASSISTA-ME 

Ao longo dos anos, filmes de ficção científica e horror transformaram em ameaças mortais praticamente todos os exemplares da nossa fauna - dos animais mais óbvios, tipo ursos, baleias e tubarões, até inofensivas formiguinhas e fofuxos coelhinhos. Mas o mesmo não aconteceu com os exemplares de nossa flora, salvo raras exceções, como a famosa planta carnívora Audrey, de "A Pequena Loja dos Horrores" (1960), e as plantas alienígenas assassinas de "O Terror Veio do Espaço" (1963), entre outras. O motivo para tamanha discriminação é bem óbvio: até as diminutas e inofensivas formiguinhas têm maior capacidade de locomoção do que uma PLANTA, que, salvo boa dose de criatividade dos roteiristas, simplesmente fica lá enraizada e imóvel, sem oferecer risco algum. Um dos maiores argumentos para o ridículo que uma ameaça vegetal representa é VEIO DO INFERNO, um daqueles filmes que você simplesmente não acredita que alguém teve a cara-de-pau de fazer... e a sério!
 
Pois a grande ameaça de VEIO DO INFERNO atende pelo nome de TABANGA (grafado como "Tabonga" e até "Tobunga" em algumas fontes), e vem a ser uma árvore demoníaca assassina que ataca os nativos e cientistas de uma lha dos mares do Sul! Visualmente, a criatura lembra um antepassado tosco do Monstro do Pântano, mas sem a mesma agilidade do personagem dos quadrinhos (e sem 1% do interesse dele, também).
O maior problema é que sendo uma árvore, e de tamanho considerável, a terrível Tabanga não tem grande poder de locomoção (NENHUM poder de locomoção, a bem da verdade), e "anda", sendo generoso, a uns 2km/h - você quase consegue visualizar lesmas reumáticas e tartarugas com as patas engessadas ultrapassando em disparada a praticamente inofensiva vilã vegetal!
Por causa desse "pequeno detalhe", Tabanga é simplesmente um dos monstros mais ridículos e menos ameaçadores do cinema de horror de todos os tempos, e os diretores e roteiristas tiveram que rebolar para criar as cenas de ataque da criatura - já que até uma velhinha de 100 anos com duas muletas poderia escapar facilmente de Tabanga.

O resultado é um filme tão ruim que inspirou uma das melhores resenhas da história, em que o crítico norte-americano Ed Naha resumiu: "From Hell It Came? Send it back!" (Veio do Inferno? Manda de volta pra lá!).
VEIO DO INFERNO é a segunda e última produção conjunta dos Irmãos Milner, dois esforçados realizadores que tentaram encontrar seu lugar ao sol no universo dos filmes baratos de ficção científica e horror dos anos 50, mas não foram muito bem-sucedidos (embora suas tralhas sejam lembradas, vistas e analisadas até hoje). Antes deste, eles tinham feito o igualmente infame "The Phantom from 10.000 Leagues" (1955), sobre um monstro marinho gerado pela radiação.
Dan Milner, que assina a direção, trabalhava como editor desde os anos 1930, e, ao abandonar os filmes de horror, acabou arranjando um prolífico bico na montagem (e direção, segundo algumas fontes) dos programas do Palhaço Bozo lá nos Estados Unidos; já seu irmão Jack aqui assina a produção, a edição e o roteiro (este em parceria com Richard Bernstein), e terminaria a carreira no departamento de som de diversos seriados de TV.
A trama se passa numa ilha em algum lugar do Oceano Pacífico, e já começa com uma bela amostra da pobreza da produção e do desinteresse dos realizadores em pesquisar os costumes das tribos daquela região. Os índios são atores norte-americanos com a pele escurecida, que falam inglês e vestem roupas que parecem retalhos de cortinas ou toalhas de mesa com estampas floridas (acima). Já vi teatrinhos de colégio com índios melhor caracterizados que estes do filme!
A tal tribo dos Mares do Sul está preparando o sacrifício de Kimo (Gregg Palmer, que parece mais um surfista do que um nativo dos Mares do Sul), que é acusado de ter matado o próprio pai (que era o antigo chefe) e também de se envolver com os "homens brancos" que chegaram à ilha - médicos e cientistas que estão no local estudando os efeitos de testes nucleares realizados nas proximidades.
Amarrado ao chão, Kimo protesta dizendo que seu pai foi assassinado num complô organizado pelo atual chefe, Maranka (Baynes Barron), e pelo feiticeiro Tano (Robert Swan). Mas, para o azar do rapaz, sua própria esposa Korey (Suzanne Ridgeway, eterna figurante de produções classe A de Hollywood) testemunha contra ele, já que também está mancomunada com os conspiradores.
Percebendo que seu destino está traçado, o inocente nativo amaldiçoa seus algozes: "Eu vou voltar do Inferno para fazer com que paguem por seus crimes!". Dito isso, é executado de maneira violenta: um dos índios dá uma cacetada no punhal que outro nativo segura sobre o coração de Kimo, enterrando-o bem fundo. E embora a cena "corte" antes de mostrar o desfecho da paulada, confesso que me deu um arrepio semelhante ao momento em que a máscara é enterrada no rosto de Barbara Steele no início do clássico "A Máscara de Satã", de Mario Bava!
 O finado Kimo é colocado num caixão de madeira (???), ainda com o punhal cerimonial enfiado no coração (aposto que os índios têm vários punhais cerimoniais de reserva para futuros sacrifícios), e rapidamente sepultado na vertical (???) no velho cemitério da tribo. Toda essa cena do sacrifício comprova a exaustiva pesquisa antropológica feita pelos realizadores, que misturaram rituais de vodu, tambores africanos e até garotas dançando "hula", tudo isso numa suposta tribo dos Mares do Sul! É quando o filme finalmente apresenta nossos protagonistas: o médico William Arnold (Tod Andrews, que parece um Humprey Bogart dos pobres) e o antropólogo Clark (John McNamara), os tais cientistas que trabalham num laboratório perto da aldeia. Como as relações com os nativos azedaram depois da morte do antigo chefe, e muitos índios continuam morrendo por consequência da radiação dos testes nucleares, um terceiro integrante é enviado para a ilha, a Dra. Terry Mason (Tina Carver) - que, aparentemente, não tem nenhum grau de parentesco com o famoso advogado Perry Mason.Terry e Arnold tiveram um breve relacionamento no passado, e isso é a desculpa para toda a "parte novelão" de VEIO DO INFERNO. Durante uns bons 20 minutos, o médico ficará incomodando a pobre mocinha e colocando pressão forte com frases machistas que eram normais na época, mas, hoje, fariam qualquer feminazi chutar a televisão - tipo "Você não pensa em marido e filhos, como todas as outras mulheres?", ou "Por que você não pára de ser médica antes e mulher depois?".

Aí, quando o espectador já está quase fechando os olhos de sono com tamanha enrolação e chauvinismo, os primeiros brotos de Tabanga, a árvore assassina em que o vingativo Kimo se transformou, começam a nascer no solo do cemitério indígena, justamente no local em que o nativo foi sepultado! (E é realmente muito engraçado pensar em Kimo como a "semente" de onde brota Tabanga!!!) Terry é a primeira a perceber o fenômeno (um tronco que cresce a uma velocidade absurda e tem feições humanas!), e insiste que os colegas devem estudar aquela estranha planta. Bill, como todo cientista de filme B, preferia destruir logo a criatura com fogo, mas é voto vencido. Assim, os cientistas desenterram Tabanga e levam a árvore-monstro para o seu laboratório, onde Terry descobre que o vegetal tem... BATIMENTOS CARDÍACOS! 

Mas nenhum dos personagens demonstra uma mínima reação de surpresa diante do fenômeno, como se toda árvore fosse assim. Inclusive a médica acredita que a bizarra planta está morrendo, e pede a ajuda dos colegas para reanimá-la. "Eu não sou cirurgião de árvores", protesta Bill, mais sério do que deveria ao soltar uma frase imbecil como essa. Terry resolve administrar um "soro estimulante experimental" na planta, já que ela tem sistema circulatório muito parecido com o de um ser humano (!!!).Feito isso, o trio sai para cuidar de suas vidas; na volta ao laboratório, eles encontram o local completamente destruído. E não há nenhum sinal de Tabanga, o que quer dizer que o tal soro estimulante experimental saiu melhor que a encomenda, e agora o monstro-árvore do Inferno está livre para se arrastar por aí e finalmente dar início à vingança prometida por Kimo lá no começo do filme (que parece ter acontecido há um século).
Pena que o soro não "estimule" a criatura tão bem assim, e ela continue se locomovendo a uma velocidade absurdamente reduzida para pelo menos parecer ameaçadora. Com isso em mente, os realizadores filmaram duas cenas diferentes em que garotas indefesas se encostam propositalmente na árvore assassina pensando ser uma árvore inofensiva (que conveniente!), poupando Tabanga do trabalho de arrastar-se com dificuldade atrás delas. E se duvida que possa ser tão ruim, confira o vídeo abaixo (que, apesar de parecer, não está em câmera lenta, é desse jeito mesmo!):
Outros nativos parecem um pouquinho mais espertos e tentam destruir a criatura com fogo. Mas isso só deixa Tabanga ainda mais furiosa, embora ela continue se arrastando naquela velocidade entre "lento" e "devagar, quase parando" (antecedendo, de certa forma, os assassinos de filmes slasher, tipo Jason, que mesmo andando devagarzinho sempre conseguem alcançar suas vítimas que saem em disparada!).

Felizmente, o homem branco Bill percebe o ponto fraco do monstro, que aquele o punhal cerimonial ainda cravado em seu tronco, lembra? Assim, ele conclui que a única forma de destruir Tabanga é empurrá-lo mais para dentro, de forma que atinja o seu coração (e não me pergunte de onde o sujeito tirou essa conclusão estapafúrdia). Mas e como chegar perto da terrível árvore assassina? Simples: basta ficar confortavelmente à distância e disparar um tiro certeiro que "empurre" o punhal mais para dentro!
VEIO DO INFERNO é um daqueles filmes tão ruins que até mesmo Ed Wood - injustamente imortalizado como o pior diretor de todos os tempos - teria vergonha de assinar. Por coincidência, Wood escreveu o seu próprio roteiro sobre planta assassina, "Venus Flytrap", que se transformou em um filme muito mais divertido (embora bem mais obscuro) dirigido por Norman Thomson em 1970.
O principal problema aqui é a falta de ritmo em todos os departamentos. Além de Tabanga não ser a mais ágil e ameaçadora das criaturas, a trama se arrasta de maneira sonolenta, colocando o monstro-árvore para atacar apenas aos 47 minutos (e isso que o filme só tem 70 minutos no total!). Durante a maior parte do tempo, o que vemos é Bill assediando Terry e os nativos zanzando para lá e para cá, temendo a anunciada vingança de Kimo.

Por isso, VEIO DO INFERNO provavelmente despencaria direto para o inferno do esquecimento, como muitas outras produções classe C da mesma época, se não fosse pela "gentileza" dos autores Harry e Michael Medved, que, em 1980, publicaram um divertido livro chamado "The Golden Turkey Awards". A obra é uma coletânea do pior do cinema mundial, e uma das grandes responsáveis por ressuscitar o então esquecido Ed Wood ao dar-lhe o título de "pior diretor de todos os tempos".
Eis que o livro dos Irmãos Medved também desenterrou a patética Tabanga, indicando a criatura ao "prêmio" de "Monstro mais ridículo da história do cinema", ao lado de concorrentes igualmente toscos como os monstrengos de "A Mulher de 15 Metros" (1958), "The Alligator People" (1959), "The Creeping Terror" (1964), "Gamera" (1965) e "Robot Monster" (1953), cujo gorila com escafandro de mergulhador ficou com o título.
Num daqueles fenômenos da cultura popular que volta-e-meia acontecem, "The Golden Turkey Awards" provocou não um distanciamento das obras eleitas como "piores", mas sim uma entusiasmada corrida de cinéfilos para conhecer estes títulos fuleiros analisados com tanto esmero. Logo, Tabanga e VEIO DO INFERNO ganharam uma segunda chance e o status de "cult", que sobrevive até hoje.

Vale ressaltar que o design da criatura foi feito pelo lendário criador de monstros da época Paul Blaisdell, o mesmo responsável pelo tosquíssimo alienígena venusiano Beluah, de "It Conquered the World" (1956), de Roger Corman, uma obra-prima do cinema trash .

Mas a culpa não é toda dele: Blaisdell fez apenas alguns esboços da árvore assassina para os Irmãos Milner, que depois levaram os desenhos do artista para o Don Post Studios construir um traje de borracha que pudesse ser vestido por um dublê (o lutador profissional Chester Hayes), alterando bastante o design original de Tabanga. O resultado é aquilo que se vê na tela: um monstrengo tosco e nada ameaçador que poderia até fazer figuração em alguma produção da Disney - ou aparecer entre os simpáticos "Ents" da série "O Senhor dos Anéis".
Mas não se engane: apesar do monstro atrapalhado, e dos seus risíveis ataques a patéticas vítimas que não conseguem escapar de uma criatura que se locomove a 2km/h, VEIO DO INFERNO é bem menos divertido do que poderia ser, e bem pior do que parece. A curiosidade por ver uma árvore assassina em ação não sobrevive à narrativa arrastada, e os momentos de humor involuntário não compensam as péssimas piadas "voluntárias", principalmente aquelas que envolvem o alívio cômico feminino interpretado por Linda Watkins, que é irritante na sua falta de graça. Talvez o filme funcione melhor pelas cenas isoladas, e nesse caso eu recomendo que o leitor procure pelos "melhores momentos" no YouTube ao invés de encarar a bagaça inteira. Ou que assista usando a tecla Fast Foward para passar os inúmeros tempos-mortos da narrativa antes da entrada em cena de Tabanga. De qualquer forma, seja pela sua incompetência como monstro assassino, seja pela fama adquirida graças ao livro "The Golden Turkey Awards", Tabanga ganhou bem mais que os tradicionais 15 minutos de fama, mantendo-se até hoje "enraizada" na galeria das piores criaturas do cinema de horror classe B de todos os tempos. Não é pouca coisa - ainda mais para uma árvore assassina!
 
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